A intensificação da fiscalização eletrônica da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) sobre o cumprimento da tabela de frete mínimo tem elevado custos logísticos e ampliado a insegurança jurídica no setor, afirma João Petrini, representante da Argus, agência global de preços com atuação nos mercados de commodities, ao portal Transporte Moderno.
Criada em 2018 após a greve dos caminhoneiros, a tabela de frete nunca teve fiscalização efetiva — até outubro deste ano, quando a ANTT colocou em operação um sistema eletrônico que cruza automaticamente dados da nota fiscal, incluindo impostos, valores destinados ao motorista, tipo de carga, rota e modelo do caminhão, com os valores mínimos estabelecidos pela agência.
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Segundo Petrini, o novo mecanismo melhora a remuneração dos caminhoneiros autônomos, mas aumenta os custos para embarcadores e transportadoras, que historicamente não seguiam a tabela por falta de controle rígido. “O impacto foi imediato, com forte alta no frete e travamento do mercado de fertilizantes”, afirmou.
A situação é agravada pela indefinição no Supremo Tribunal Federal (STF), que desde 2018 analisa a constitucionalidade da tabela sem decisão final. Em novembro, decisões judiciais estaduais suspenderam a aplicação de multas, o que reduziu os valores do frete e trouxe “uma segurança dentro da insegurança jurídica”, nas palavras de Petrini.
Problema central é o cálculo da tabela de frete
Para o especialista, o problema central é o cálculo da tabela, que ignora variações regionais, disponibilidade de caminhões e condições de frete de retorno. Caso a fiscalização seja mantida, ele defende a revisão da metodologia e atualizações mais frequentes — semanais ou quinzenais — para refletir melhor as condições reais do mercado.
A distorção também tem estimulado a busca por caminhões de nove eixos, que resultam em valores mais baixos no cálculo da ANTT. A limitada oferta desses veículos, porém, tem contribuído para travar especialmente o mercado de fertilizantes.
Segundo Petrini, não há hoje uma discussão estruturada no governo federal para aprimorar a tabela. Entidades têm debatido o tema internamente e entregaram à Frente Parlamentar do Agronegócio um documento pedindo mudanças no cálculo ou adiamento da fiscalização.
Ele avalia que o impasse deve se estender ao menos até 2026. Uma safra recorde prevista para 2025 e 2026 pode aliviar o frete de grãos, que historicamente opera acima da tabela, mas o segmento de fertilizantes tende a seguir mais pressionado.
Como funciona o novo modelo de fiscalização?
O modelo de fiscalização agora se apoia nas informações do Manifesto Eletrônico de Documentos Fiscais (MDF-e), emitido pela empresa contratante do transporte. O sistema cruza automaticamente dados de diversas notas fiscais associadas à operação logística e compara os valores declarados com a tabela de piso mínimo. Se o valor estiver abaixo do patamar legal, a irregularidade é identificada sem abordagem física.
A ANTT afirma que o objetivo é aprimorar auditorias fiscais e dar mais transparência ao setor. Na prática, porém, o movimento tem pressionado custos. As transportadoras, em grande parte, vêm se adaptando às novas exigências — que variam conforme tipo de carga, distância percorrida e número de eixos do caminhão. Mas embarcadores e misturadoras resistem aos reajustes, que podem elevar em até 50% o custo logístico.
A consequência direta, segundo a Argus, é a queda na movimentação de fertilizantes em algumas rotas, o que mantém os preços do frete do segmento em estabilidade, porém com menor liquidez.
Alta regulamentação, baixa produtividade
O cenário atual reforça críticas que já vinham sendo feitas por empresários do setor. Para Tony Bernardini, CEO da Edini Transportes e especialista em gestão de transportadoras, o país vive “mais um momento de insegurança jurídica” decorrente da Política Nacional do Piso Mínimo de Fretes, criada em 2018 após a greve dos caminhoneiros.
“No papel, a intenção era proteger o transportador. Sete anos depois, somamos R$ 127 milhões em multas, boicote a caminhoneiros de 6 eixos, tentativas de burlar regras e um ambiente jurídico incerto”, afirma. Bernardini destaca que o cálculo da tabela parte de premissas distantes da realidade — como frota-modelo composta por caminhões novos, enquanto a idade média da frota brasileira supera 20 anos.
Para ele, o problema central não é apenas o valor da tabela, mas a dificuldade de adesão do próprio mercado. “Contratantes e transportadores tentam judicializar multas e empurrar o problema esperando que o STF declare a tabela inconstitucional”, diz.
O empresário afirma ainda que o excesso de normas — como frete mínimo, MDF-e, CIOT, regras de jornada e burocracia fiscal — cria uma operação lenta. “O caminhão passa mais horas parado do que rodando. A estratégia existe, mas a cultura operacional não permite que seja executada”, afirma.
Segundo ele, o país precisaria discutir menos apenas os números da tabela e mais o desenho regulatório como um todo. “Transformar cada viagem em um labirinto normativo é o que trava a produtividade do transporte rodoviário e afasta empreendedores e motoristas.”
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