Renda de caminhoneiros dobra em quatro anos, mas poder de compra diminui

Pesquisa da Childhood revela queda histórica em práticas abusivas, mas aponta que violência sexual continua presente nas rodovias brasileiras

Aline Feltrin

A partir de 1º de agosto, motoristas profissionais no Brasil estarão sujeitos a novas regras para exames toxicológicos, conforme a Portaria MTE n. 612. As mudanças incluem a introdução de testes aleatórios, exigências de atualização no e-Social, e a obrigatoriedade de exames na admissão e demissão dos motoristas.

A renda média dos caminhoneiros brasileiros voltou a subir em 2025, após um período de forte queda, mas ainda não recuperou o poder de compra registrado há 15 anos. É o que mostra a 5ª edição da pesquisa O Perfil do Caminhoneiro Brasileiro, divulgada pela Childhood Brasil em parceria com a Universidade Federal de Sergipe (UFS). O estudo completou 20 anos de monitoramento e ouviu 620 motoristas em diferentes regiões do país.

Segundo o levantamento, a renda nominal da categoria passou de R$ 3.200 em 2021 para R$ 6 mil neste ano. Mesmo com a recuperação, o valor equivale hoje a quatro salários mínimos — proporção inferior à de 2010, quando a remuneração alcançava 5,77 mínimos. Para os pesquisadores, a melhora recente deve ser lida com cautela: “a renda cresce, mas a precarização permanece”, resume o relatório.

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Os dados revelam que o aumento nominal não se traduz em melhores condições de trabalho. A maioria dos entrevistados relata enfrentar insegurança constante nas rodovias (73,8%), infraestrutura deficiente (66,9%) e longas esperas para carga e descarga, que reduzem produtividade e impacto econômico das viagens. As paradas seguem concentradas em postos de combustível, e 80% dos caminhoneiros reclamam da falta de banheiros adequados — problema ainda mais crítico entre as mulheres, que apontam a insalubridade dos sanitários como o maior obstáculo para permanecer no setor.

Mesmo com a experiência média de 17 anos na profissão, 86% afirmam que o trabalho do caminhoneiro é mal visto pela sociedade, percepção que, segundo o estudo, contribui para a desvalorização econômica e simbólica do transporte rodoviário de cargas no país.

Exploração sexual persiste nas estradas, apesar de queda no envolvimento

O relatório também mostra avanços significativos na conscientização sobre exploração sexual de crianças e adolescentes nas rodovias. A autodeclaração de envolvimento em casos de ESCA caiu de 36,8% em 2005 para 4% em 2025. Hoje, 96% dos motoristas dizem não ter tido relações sexuais com menores nos últimos cinco anos — o melhor resultado da série histórica.

Apesar disso, a percepção de que o problema continua presente nas estradas permanece alta: 78% dos entrevistados afirmam identificar situações de risco, e o número de caminhoneiros que relatam ver meninos sendo explorados aumentou de 32% em 2021 para 43% este ano. A Childhood atribui o movimento não a um crescimento das ocorrências, mas a maior capacidade de reconhecer casos e sinais de vulnerabilidade.

O estudo também alerta para a migração de parte da exploração para ambientes digitais. De acordo com os motoristas, 9,5% já receberam ofertas envolvendo menores por aplicativos de mensagens, e 7,7% tiveram contato com material sexual envolvendo crianças e adolescentes de forma involuntária.

O contato com o Programa Na Mão Certa, criado em 2005, continua associado a práticas mais seguras e a menor adesão a comportamentos machistas ou de risco. A Childhood reforça que renda, infraestrutura e políticas de conscientização caminham juntas — e que o avanço econômico recente, isoladamente, não resolve os problemas estruturais do setor.

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