De Porto Alegre (RS)
O mercado brasileiro de caminhões deve enfrentar um cenário difícil em 2026 ainda sob o peso de juros elevados, instabilidade política e incertezas ligadas ao comércio internacional. Essa é a avaliação de Luis Gambim, diretor comercial da DAF Caminhões, em entrevista exclusiva ao portal Transporte Moderno, durante da TranspoSul 2025 – maior feira de transporte do Sul do país.
“O cliente hoje se depara com financiamentos a taxas que podem superar 20% ao ano. Isso trava decisões de renovação de frota”, afirma o executivo. Apesar do cenário restritivo, ele vê boas oportunidades com transportadoras e produtores mais estruturados.
Segundo Gambim, o segmento de semipesados tem sustentado parte da demanda em 2025, puxado pela construção civil e pelo e-commerce, que ampliaram a necessidade de veículos de distribuição urbana e regional. “É um nicho que vem crescendo e no qual vamos ampliar a oferta nos próximos anos”, diz. A DAF, no entanto, cresceu apenas 2,9% nesse mercado, contra 9% da média do setor, por ainda não oferecer modelos competitivos em todas as configurações.
Já os caminhões pesados, diretamente ligados ao agronegócio e à exportação de commodities, recuaram quase 20% no ano. O executivo cita a queda nos preços internacionais de soja, milho, açúcar e algodão como fatores que reduziram a rentabilidade do setor. “Um cliente de Rio Verde me disse que está estocando soja porque não compensa vender. Outro, produtor de café em Minas, relatou queda de 30% no volume de exportação pelo Porto de Santos. Nessas condições, não há estímulo para renovar frota”, relata.
Além das cotações mais baixas, o setor enfrenta o impacto do tarifaço dos Estados Unidos, que elevou em até 50% as tarifas sobre produtos como café, aço, placas solares e autopeças. “Vários clientes reduziram ou pararam a operação de exportação. Isso se reflete diretamente na compra de caminhões”, observa Gambim.
No segmento de pesados, a DAF caiu 18,5% em 2025, contra recuo de 19,4% do mercado, mostrando resiliência. Já nos semipesados, a performance ficou abaixo da média. A fábrica de Ponta Grossa opera com cerca de 30% de ociosidade, nível considerado administrável e sem risco de cortes de pessoal, segundo o executivo.
Para enfrentar a retração, a DAF tem recorrido a ferramentas como consórcio, taxas especiais, planos de manutenção e campanhas de incentivo a vendedores. A ideia é manter clientes próximos e orientá-los sobre momentos de compra, mesmo em ambiente de crédito caro. “Com juros altos, o consórcio tem se tornado alternativa importante para o cliente planejar a renovação”, afirma Gambim.
Exportações e ciclo de investimentos
A DAF tem buscado reduzir sua dependência do mercado doméstico. O plano é transformar a fábrica de Ponta Grossa (PR) em hub de exportações para a América Latina. “O Brasil não pode depender apenas do consumo interno, precisamos avançar como base regional para Chile, Peru, Colômbia, Argentina, Panamá, Uruguai e Paraguai”, afirma.
Hoje, a maior parte dos veículos exportados para a região sai da Holanda, enquanto a produção brasileira responde por uma fatia menor. A montadora, controlada pela Paccar, está no meio de um ciclo de investimentos de cinco anos, voltado à expansão da capacidade produtiva e ao aumento da nacionalização.
Na Fenatran 2026, a montadora deve apresentar novidades em seu portfólio, porém o executivo não revela quais. Nas palavras de Gambim, a prioridade é consolidar a linha a diesel no Brasil antes de investir em alternativas energéticas. “Temos ainda lacunas de portfólio no mercado local. A meta é fechar essas brechas e entregar um produto competitivo a diesel”, afirma Gambim.
Enquanto isso, na Europa e nos Estados Unidos, a marca já testa caminhões elétricos, a gás, a hidrogênio e até modelos autônomos. Uma fábrica de baterias está em construção na Europa, em parceria com Cummins e Mercedes-Benz.
Perspectivas futuras
Gambim aposta que o mercado brasileiro deve encerrar 2025 com cerca de 100 mil unidades vendidas, somando todos os segmentos. “Acima de 16 toneladas, o Brasil deve fechar em torno de 82 a 83 mil veículos. Somando os leves, o mercado chega na casa dos 100 mil”, detalha. Para 2026, ele projeta desempenho semelhante, salvo a criação de algum programa de incentivo governamental.
“Recentemente, representantes do setor se reuniram com o vice-presidente Geraldo Alckmin e com o presidente do BNDES, Aloizio Mercadante, mas sem perspectiva de novos financiamentos direcionados”, afirma.
Segundo Gambim, o mercado anda de lado, mas não é desastroso. “Já enfrentamos momentos piores, como em 2015, quando mal superamos 50 mil unidades”, compara. Para o executivo, a visibilidade segue restrita: “Não há sinais de piora, mas também não há gatilhos claros para uma virada. O Brasil é volátil: tudo pode mudar com velocidade”, conclui.
A jornalista viajou a convite da organização do evento.
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