Com foco no potencial de negócios do mercado brasileiro da economia circular automotiva, a Stellantis, conglomerado que engloba marcas como Fiat, Peugeot e Citroën, replicou na América do Sul uma iniciativa bem-sucedida na Itália e inaugurou o primeiro centro de desmontagem veicular circular de autopeças de uma montadora na região, localizado em Osasco (SP). A iniciativa reforça o interesse da empresa em ampliar as oportunidades de negócio em sinergia com o pós-vendas.
O vice-presidente de peças e serviços da Stellantis América do Sul, Paulo Solti, ressaltou que o novo centro de desmontagem se soma ao centro de recondicionamento de veículos em Betim, formando um ciclo completo de vida para os automóveis, que inclui uso, design, produção e fim de vida. O modelo adota a premissa da economia circular dos 4Rs — Remanufaturar, Reciclar, Reutilizar e Reparar — permitindo até 80% de economia em matéria-prima e até 50% de redução nas emissões de CO₂ em comparação com peças novas equivalentes. O centro trabalhará inicialmente com 400 tipos de peças, incluindo caixas de direção, alternadores e motores de partida.
“O mercado brasileiro é composto por cerca de 48 milhões de veículos, mas apenas 1,5% recebe destinação adequada no fim de vida útil. Quando se olha para países como o Japão e outros na Europa, essa porcentagem chega a 95%. Ou seja, existe espaço para um crescimento muito relevante. Anualmente, cerca de 2 milhões de carros chegam ao fim do ciclo, gerando um mercado de reciclagem com potencial de R$ 2 bilhões ao ano. Em uma conta rápida, cada carro reciclado gera em torno de R$ 3 mil de receita. É um mercado que pode crescer rapidamente”, detalha.
O investimento total no centro de desmontagem foi de R$ 13 milhões. “Vamos desmontar carros de todas as marcas e comercializar peças de todas as marcas. Estamos olhando para o parque automotivo brasileiro. A operação prevê a contratação de 150 pessoas até 2027, e a capacidade de desmontagem do centro é de 8 mil veículos por ano”, conta. As peças, componentes e materiais que não podem ser remanufaturados ou recuperados, como os de segurança, serão destinados a parceiros para o correto descarte ou reciclagem.
Canais físicos e digitais
As peças usadas em perfeitas condições, recuperadas dos veículos desmontados, serão comercializadas para consumidores finais em canais físicos e digitais. Em Osasco (SP), o atendimento será realizado na loja física do centro de desmontagem, instalada em um contêiner de vendas. No ambiente online, os componentes estarão disponíveis na loja oficial da circular autopeças no Mercado Livre e, em breve, também em um e-commerce próprio.
Questionado sobre a sinergia – ou concorrência – com a DPaschoal, na qual a Stellantis tem 70% do controle acionário, o executivo respondeu: “O portfólio da circular autopeças faz parte do portfólio de vendas da DPaschoal. Quanto mais crescermos na desmontagem e comercialização, mais eles crescerão”.
O desmonte
Todas as vendas seguem os critérios de rastreabilidade e segurança do Detran, garantindo conformidade com a legislação e peças em perfeitas condições de uso, com qualidade e procedência certificadas.
O centro de desmontagem recebe veículos sinistrados, classificados como perda total, ou automóveis que chegaram ao fim de sua vida útil. Esses veículos são adquiridos por meio de leilões e passam por um processo estruturado e regulamentado de desmonte, que garante a destinação ambientalmente correta de peças e materiais.
Ao chegar à unidade, o veículo passa por uma área de descontaminação, onde são retirados todos os fluidos, como óleos e combustíveis. Em seguida, segue para a linha de desmontagem, onde técnicos avaliam a condição geral do veículo e de seus componentes por meio de testes e inspeções detalhadas.
As peças aptas ao reaproveitamento são separadas para reuso ou remanufatura. As que serão reutilizadas passam por um processo de limpeza com produtos biodegradáveis e recebem uma identificação individual com classificação, valor de mercado e etiqueta de rastreamento emitida pelo Detran.
Cada veículo é vinculado a uma “carteira de desmonte”, emitida por fornecedor homologado, que contempla até 49 grupos de peças com rastreabilidade total, incluindo informações sobre o veículo de origem, quem realizou o desmonte e a procedência da peça. Além das exigências dos órgãos reguladores, a Stellantis utiliza um sistema próprio para codificação e controle de qualidade, assegurando a padronização de todo o processo.
“Hoje, temos uma destinação correta para 100% dos materiais dos veículos desmontados. Desde os fluidos, como óleos e combustíveis, até matérias-primas como aço, ferro, alumínio, cobre e outros metais nobres, tudo é reaproveitado. Os materiais são separados por tipo e encaminhados para os diversos fornecedores parceiros da Stellantis, garantindo a reutilização e contribuindo para a redução dos impactos ambientais”, explica Solti.
Desmembrado, o veículo tem as peças classificadas com notas de 0 a 9 para avaliar seu estado de conservação e de reaproveitamento. Entre 0 e 4, os componentes são descartados e destinados de maneira correta por um parceiro. Acima de 5, são preparados para venda. Segundo o vice-presidente de economia circular da Stellantis, Alexandre Aquino, uma peça com nota 9 pode ser vendida, em média, por um valor 50% inferior a uma peça nova. Mas tudo vai depender da oferta e demanda. “Vamos aprender com o tempo e com o próprio mercado as medidas da precificação”.
O centro oferece serviços completos, que incluem funilaria, pintura, manutenção mecânica, reparos, substituição de peças, higienização, inspeção e certificação. Todas as etapas são realizadas com foco em segurança, qualidade e sustentabilidade, contribuindo para ampliar o ciclo de vida dos veículos e reforçando o compromisso da Stellantis com práticas responsáveis.
Ano de crescimento
Presente à inauguração, o presidente da Stellantis América do Sul e responsável global pelo programa Stellantis Pro One, Emanuele Cappellano, destacou o desempenho da empresa na região. Em 2025, a empresa lidera o mercado automotivo sul-americano, com mais de 568 mil veículos vendidos e market share de 23,4% no acumulado do ano. “Este é um ano de crescimento para a empresa na América do Sul como um todo. Obviamente enfrentamos desafios com a taxa de juros, que cria uma pressão no mercado, além da instabilidade das moedas e dinâmicas internacionais que também colocam volatilidade no sistema, mas podemos dizer que a Stellantis performou bem. Continuamos na liderança no Brasil, na Argentina, no Chile e no Uruguai”, diz.
Ainda sobre a performance da empresa, Cappellano citou modelos como a Fiat Strada, líder no Brasil, e o Peugeot 208, líder na Argentina, a consolidar a posição da companhia, que também se destaca com a produção nacional de novos modelos e expansão regional. “Houve outros marcos ao longo do ano, como as 1.500 novas contratações no Brasil, inauguramos o polo de picapes médias em Córdoba, na Argentina, os 10 anos do Polo Stellantis de Goiana (PE), iniciamos a contagem regressiva dos 50 anos da Fiat no Brasil, a marca histórica de 18 milhões de veículos produzidos no Polo Betim (MG) e o aumento de 93% nas exportações”, detalha.
No ano passado, a empresa anunciou um plano de investimentos de R$ 32 bilhões na América do Sul para inovação e tecnologia automotiva, o que abrange manufatura 5.0 com uso de inteligência artificial, abastecimento com etanol, energias renováveis e desenvolvimento de produtos híbridos e elétricos. O centro de mobilidade híbrida-flex, o Safety Center para testes de segurança e o recorde de patentes em 2024 reforçam essa trajetória.
“Outro foco desses recursos é criar um ambiente sustentável, investindo em um ecossistema de tecnologia e inovação. E isso passa pelos produtos e também pela modernização dos processos produtivos envolvendo toda a cadeia de suprimento. Não podemos deixar de falar nos processos de pós-venda e economia circular. Queremos ganhar competências no que se refere à economia circular, que será uma demanda das instituições e da própria sociedade.”, finaliza.
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