Igor Calvet, presidente da Anfavea: “Estamos trabalhando com o governo para criar mecanismos que estimulem a renovação da frota, como incentivos tributários e linhas de financiamento específicas”

O executivo assumiu a presidência da Anfavea com o desafio de liderar a entidade em meio à transformação da indústria automotiva. Ex-ApexBrasil e MDIC, Calvet traz experiência pública e visão estratégica. Defende inovação, sustentabilidade e reindustrialização para reposicionar o setor como protagonista na mobilidade e transição energética.

Aline Feltrin

Transporte Moderno – Qual é a sua principal missão à frente da Anfavea?

Igor Calvet – Reposicionar a Anfavea como uma entidade moderna, respeitada e propositiva. Quero que sejamos protagonistas nas grandes transformações que o setor está vivendo. E, principalmente, quero que sejamos ponte entre a indústria, o governo e a sociedade — com diálogo, responsabilidade e visão de futuro.

Transporte Moderno – Como essa modernização vai acontecer na prática?

Igor Calvet – Estamos em um processo de transição para um modelo de governança com presidência executiva profissional. Isso nos permitirá mais agilidade nas decisões, maior transparência e melhor interlocução com o governo e a sociedade. A Anfavea precisa estar mais preparada para lidar com a complexidade do setor e suas pautas estruturantes.

Transporte Moderno- Qual é o significado de assumir a Anfavea neste momento?

Igor Calvet – É um desafio enorme e, ao mesmo tempo, uma grande oportunidade. A indústria automotiva está em profunda transformação global, e o Brasil tem plenas condições de protagonizar essa mudança. Nosso objetivo é transformar a Anfavea numa entidade moderna, propositiva e sintonizada com as demandas da sociedade e dos nossos associados.

Transporte Moderno – Quais são os principais eixos de atuação definidos pela entidade?

Igor Calvet – Estabelecemos três eixos de atuação externa: transição energética, competitividade e integração global. Internamente, vamos modernizar a governança, fortalecer a comunicação institucional e investir em dados e inteligência setorial para embasar nossas propostas.

Transporte Moderno – Você tem experiência no setor público. Isso contribui no papel à frente da Anfavea?

Igor Calvet – Com certeza. Entender como o governo pensa, seus processos e limitações, facilita o diálogo institucional. Minha passagem pela ApexBrasil e pelo Ministério da Economia me dá uma visão ampla das políticas públicas e da dinâmica entre Estado e setor produtivo. Isso me permite atuar de forma mais estratégica e construtiva.

Transporte Moderno – O setor ainda enfrenta entraves estruturais importantes. Quais os maiores gargalos na sua visão?

Igor Calvet – Sem dúvida, o custo Brasil continua sendo o principal obstáculo. Temos dois fatores críticos: o custo de capital, com juros ainda muito elevados, e o custo logístico, que encarece o escoamento da produção. É fundamental avançar em reformas, reduzir burocracias e investir em infraestrutura para mudar esse cenário.

Transporte Moderno – E como será a comunicação da Anfavea com a sociedade e o governo?

Igor Calvet – Vamos investir numa comunicação mais transparente, proativa e estruturada. Precisamos mostrar à sociedade a importância econômica e social da indústria automotiva. Isso também fortalece nossa interlocução com o governo e legitima nossas propostas de políticas públicas.

Transporte Moderno – Como a Anfavea está lidando com a necessidade de localização da produção?

Igor Calvet – A localização é estratégica para gerar valor no país, reduzir a dependência externa e criar empregos de qualidade. Estamos trabalhando para fortalecer a cadeia local e ampliar a capacidade de fornecimento doméstico, sempre em diálogo com o governo para assegurar incentivos adequados e previsibilidade regulatória.

Transporte Moderno – A indústria brasileira de caminhões perdeu espaço para montadoras asiáticas na exportação para países da América do Sul. O que explica essa perda?

Igor Calvet – Existem vários fatores: preço, posicionamento estratégico e escala global. Precisamos facilitar o acesso das nossas associadas às tecnologias desenvolvidas no exterior e fomentar a inovação local. Um ambiente de negócios mais previsível e competitivo ajuda a reverter essa tendência.

Transporte Moderno – A exportação também está no radar da nova gestão?

Igor Calvet – Sim, e com prioridade. Precisamos tornar nossos produtos mais competitivos no exterior. Isso passa por rever instrumentos de apoio à exportação, estimular novos acordos comerciais e simplificar o processo de comércio exterior. Temos que posicionar o Brasil como um player global relevante.

Transporte Moderno – Em relação à transição energética, qual o papel da Anfavea no setor de pesados?

Igor Calvet – A transição energética em veículos pesados exige atenção especial. São operações diferentes, rotas longas e características únicas. Por isso, defendemos uma estratégia tecnológica diversificada, que considere eletrificação, gás, biocombustíveis e soluções híbridas. Tudo adaptado à realidade brasileira

Transporte Moderno – Há estudos que projetam esse ritmo de adoção?

Igor Calvet – Sim, temos estudos robustos que avaliam a adoção de novas tecnologias nos próximos 10 a 15 anos, especialmente em pesados. Eles se baseiam em entrevistas com consumidores, executivos e análises técnicas. A eletrificação vai avançar, mas será um processo gradual, com múltiplas tecnologias coexistindo.

Transporte Moderno – O Brasil tem um perfil de frota de caminhões envelhecida. Como a Anfavea vê esse desafio?

Igor Calvet – É um tema prioritário. Renovar a frota significa mais segurança nas estradas, menos emissões e maior eficiência no transporte. Estamos trabalhando com o governo para criar mecanismos que estimulem essa renovação, como incentivos tributários e linhas de financiamento específicas. É uma política pública com efeitos positivos imediatos.

Transporte Moderno – E quanto ao financiamento para o setor? Há novas alternativas?

Igor Calvet – Sim, estamos discutindo mecanismos que permitam crédito mais acessível, sem distorcer o mercado. O antigo PSI Finame foi relevante em seu tempo, mas hoje buscamos soluções sustentáveis, que deem fôlego para os compradores e estimulem a renovação da frota, especialmente de pesados.

Transporte Moderno – Como você enxerga o papel dos caminhões a gás e do biometano na matriz logística?

Igor Calvet – O gás natural e o biometano são alternativas viáveis e com grande potencial no curto e médio prazo, especialmente no transporte pesado. O Brasil tem condições privilegiadas para produzir e distribuir esses combustíveis. Precisamos garantir segurança regulatória e ampliar a infraestrutura de abastecimento para consolidar esse caminho.

Transporte Moderno – Como a Anfavea pretende contribuir com a agenda ESG?

Igor Calvet – A indústria automotiva já vem investindo em processos mais limpos, materiais recicláveis e tecnologias de baixa emissão. A Anfavea tem um papel importante de articulação para que essas boas práticas se disseminem em toda a cadeia. Além disso, estamos estruturando métricas para acompanhar e reportar avanços de forma transparente.

Transporte Moderno – Há espaço para a indústria nacional ganhar protagonismo em tecnologia automotiva?

Igor Calvet – Sim, e precisamos acelerar nesse sentido. O Brasil tem centros de engenharia de excelência e talentos reconhecidos globalmente. Com o ambiente certo de negócios e estímulos à inovação, podemos desenvolver soluções locais, inclusive com potencial de exportação. Essa é uma das nossas metas estratégicas.

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