Porto de Santos concentra atrasos e trava exportações de café em abril, aponta Cecafé

Conforme o relatório, dos 171 navios porta-contêineres que passaram por Santos no mês, 99 enfrentaram descompassos operacionais, sendo que o maior tempo de espera chegou a 31 dias. Autoridade Portuária de Santos (APS) se manifesta; confira

O porto de Santos registrou em agosto a movimentação de 15,89 milhões de toneladas de carga. Com esse resultado, que é 4,9% superior ao mesmo mês de 2023 (15,15 milhões de toneladas), alcança mais um recorde, segundo a Autoridade Portuária de Santos (APS).

Aline Feltrin

O Porto de Santos, maior corredor logístico para o café brasileiro, tornou-se o principal gargalo das exportações da commodity em abril, segundo dados do Boletim Detention Zero (DTZ), elaborado pela startup ElloX Digital em parceria com o Cecafé (Conselho dos Exportadores de Café do Brasil). O documento revela que 58% dos navios que atracaram no terminal tiveram atrasos ou mudanças de escala, afetando diretamente a fluidez das operações.

Conforme o relatório, dos 171 navios porta-contêineres que passaram por Santos no mês, 99 enfrentaram descompassos operacionais, sendo que o maior tempo de espera chegou a 31 dias. O cenário, conforme análise do Cecafé, revela o esgotamento da infraestrutura portuária mesmo em um período de entressafra, quando o fluxo de cargas tende a ser mais leve.

Além disso, 28% dos embarques tiveram menos de dois dias de gate aberto, dificultando a consolidação das cargas. Outros 66% ficaram entre três e quatro dias e apenas 7% superaram os quatro dias, comprometendo a previsibilidade logística das tradings.

Por meio de nota enviada ao Portal Transporte Moderno, a Autoridade Portuária de Santos (APS) informou que alterações de escalas de navios são parte da natureza da operação portuária e podem ser motivadas por diversos fatores: climáticos e oceanográficos (condições de maré), documentais e até mesmo de conveniência do cliente, por questões de mercado ou de logística terrestre.

O comunicado ainda esclarece queo Porto de Santos é um parque portuário com 55 terminais marítimos que atendem os mais variados tipos de carga, de granéis vegetais (soja, milho, açúcar, trigo) a granéis líquidos e contêineres. Neste último é que são embarcados a maior parte do café em grãos exportado. Em dados de 2024, Santos foi responsável por cerca de 70% do café exportado pelo Brasil e, neste ano, já houve aumento de 3,5% no embarque desta carga em relação ao mesmo período de 2024 (janeiro a abril).”

Atrasos em série também no Rio de Janeiro

O complexo portuário do Rio de Janeiro, segundo maior ponto de escoamento do café brasileiro (com 16% da participação entre janeiro e abril), também apresentou índice de atraso de 67% em abril. De um total de 39 navios com destino à exportação da commodity, 26 tiveram escalas alteradas, com tempo máximo de espera de 15 dias.

Entre os embarques realizados no Rio, 46% tiveram menos de dois dias de gate aberto, 36% entre três e quatro dias e apenas 18% com janelas superiores a quatro dias.

Exportadores deixam de embarcar 737 mil sacas de café

O impacto logístico registrado nos portos do país fez com que o setor deixasse de exportar 737,7 mil sacas de 60 kg de café em abril — volume equivalente a 2.236 contêineres. Segundo o Cecafé, a consequência direta foi um prejuízo de R$ 6,657 milhões às empresas exportadoras, com custos extras relacionados a armazenagem, detentions, pré-stacking e antecipações de gates.

Desde junho de 2024, quando o Cecafé iniciou o monitoramento dos impactos da infraestrutura portuária, o acumulado de perdas já chega a R$ 73,2 milhões.

A não exportação do café comprometeu também a entrada de divisas no país. Com base no preço médio Free on Board (FOB) de US$ 445,47 por saca e câmbio médio de R$ 5,7831 em abril, o Brasil deixou de arrecadar US$ 328,6 milhões, o equivalente a R$ 1,9 bilhão em receitas cambiais.

Para Eduardo Heron, diretor técnico do Cecafé, os problemas de infraestrutura portuária comprometem a credibilidade do Brasil como fornecedor global e demandam ações emergenciais por parte do poder público. Ele critica a lentidão na tramitação de projetos como o leilão do Tecon Santos 10, o túnel Santos-Guarujá e a nova via da Rodovia Anchieta.

“Essas obras levarão, no mínimo, cinco anos para sair do papel. E a restrição à participação de armadores no leilão do terminal Tecon Santos 10 pode judicializar o processo e atrasar ainda mais os investimentos”, alerta Heron.

Prejuízos para o produtor

O impacto logístico afeta diretamente os produtores de café. Segundo o Cecafé, o Brasil é líder global na transferência do valor FOB ao produtor: 88,3% para o arábica e 96,5% para o canéfora (robusta e conilon). Quando as exportações não ocorrem por falta de infraestrutura, essa receita deixa de chegar ao campo, prejudicando a renda do produtor rural.

“O cafeicultor brasileiro é exemplo de sustentabilidade e qualidade. Não conseguir embarcar o café por causa da logística é inaceitável e compromete todo o setor produtivo”, afirma Heron.

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