Fusão entre Gol e Azul poderá ampliar a conectividade, mas há risco de concentração de mercado, dizem especialistas

A intensão da união de negócios entre a Abra, controladora da Gol, e a Azul tem gerado discussões sobre os benefícios para a conectividade e redução de custos, especialmente no transporte de cargas, com destaque para o potencial aumento de opções e a expansão das rotas internacionais

A área técnica do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) analisa os contratos da parceria anunciada entre a Azul e a Gol para avaliar se a operação precisará ser notificada ao órgão.

Aline Feltrin

A recente manifestação sobre a intenção de fusão entre Abra, que controla a Gol, e a Azul tem gerado intensos debates no setor aéreo brasileiro. Para alguns especialistas, o movimento promete ampliar a conectividade e reduzir custos operacionais, especialmente no transporte de cargas. No entanto, há preocupações sobre a concentração de mercado, que poderia levar a um aumento nas tarifas e a desafios regulatórios por parte do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE) e da Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC).

Paulo Resende, professor e coordenador do núcleo de infraestrutura, supply chain e logística da Fundação Dom Cabral, avalia que a fusão pode beneficiar o setor de cargas, especialmente nas rotas menos atendidas pelas duas companhias. “Com 90% sendo complementares, há uma oportunidade de ampliar a oferta, principalmente em áreas remotas. Isso pode reduzir os custos e melhorar a logística”, afirmou. Contudo, ele alerta que o maior risco recai sobre o transporte de passageiros, com a possível diminuição da concorrência. “Se a fusão reduzir ainda mais as opções no mercado, isso pode impactar as tarifas, algo que dificilmente passaria pelo CADE”, completa.

Oliveir Girard, sócio-diretor da consultoria Macroinfra, compartilha uma visão semelhante no que diz respeito ao setor de cargas. “Quando as rotas são complementares, a fusão pode ampliar as opções e reduzir os custos do frete aéreo. Contudo, a falta de aeronaves globalmente pode limitar essa expansão”, observa Girard.

Ele acrescenta que a maior diversificação de rotas pode beneficiar o transporte de cargas, principalmente para grandes destinos internacionais, mas que o impacto sobre os custos será limitado, uma vez que estes estão atrelados ao preço do combustível e ao leasing das aeronaves.

Em relação à infraestrutura, Girard é cético quanto à ampliação significativa nos terminais de carga. Ele acredita que a fusão não será o principal motor para o aumento da infraestrutura aeroportuária, que depende mais das concessionárias. “Onde a união entre as companhias pode ter impacto é nas áreas mais remotas, cuja demanda por terminais é menor e a carga pode ser tratada junto com as bagagens dos passageiros”, disse.

O que dizem as companhias aéreas?

As companhias aéreas, por sua vez, defendem que a fusão é uma oportunidade para impulsionar o crescimento da indústria aeronáutica nacional. Em nota, a Azul afirmou que a união ajudará a expandir a oferta de destinos e serviços, tanto no Brasil quanto no exterior. “O objetivo é aumentar a conectividade e proporcionar mais opções para os consumidores brasileiros”, afirmou a empresa.

A Gol destaca que o memorando de entendimento assinado no último dia 15 de janeiro não implica mudanças imediatas em suas operações. Em um vídeo direcionado aos colaboradores, do qual a reportagem do portal Transporte Moderno teve acesso, o CEO Celso Ferrer afirmou que a Abra reafirma seu apoio ao plano de independência da companhia e à sua reestruturação. “Nada muda com essa operação. A Abra é uma plataforma de investimento e busca sinergias no setor aéreo”, ressaltou Ferrer.

De acordo com o CEO, as duas empresas continuarão com suas operações independentes, sendo necessário aguardar as aprovações regulatórias para dar continuidade ao processo. Caso a fusão seja concretizada, a expectativa é de que a combinação das malhas aéreas ofereça mais opções de voos e expanda as rotas internacionais. No entanto, o impacto sobre a concorrência e as tarifas ainda depende de esclarecimentos mais detalhados das companhias e das autoridades regulatórias.

No vídeo, Ferrer também reforçou que a Abra também tem como objetivo buscar eficiência e sinergia em empresas do setor aéreo. “A Abra foi criada com a união de investidores estratégicos, entre eles a família Constantino, fundadora da Gol”, lembrou o CEO. Segundo ele, a Abra avaliou que seria positivo explorar mais a fundo a operação da Azul.

Ferrer explicou que o memorando é um acordo legal que permite às partes conhecer melhor seus negócios, sem assumir compromissos sobre os próximos passos. Ele também reiterou que o anúncio não impacta as operações ou a estratégia da companhia aérea. “A Gol já tem um acordo com a Azul, nossa parceira, mas o acordo com a Abra marca o início de um longo processo que pode ou não culminar em uma consolidação”, afirmou.

Caso o negócio avance, o memorando de entendimento entre Abra e Azul estabelece a necessidade de uma base financeira sólida e assegura que as marcas e os certificados internacionais continuarão independentes. “Com nossa posição fortalecida, exploraremos junto à Azul todo o potencial dos mercados onde atuamos”, completou Ferrer.

Se o processo não avançar, o CEO garantiu que a Gol continuará a seguir seu plano de crescimento e fortalecimento financeiro. “Estamos mais fortes do que há um ano. Nos últimos meses, avançamos como empresa independente e é assim que sairemos do “Chapter Eleven” (Capítulo 11), afirmou, destacando que o plano de reestruturação é focado no longo prazo. O termo trata-se de um processo legal nos Estados Unidos que permite a uma empresa em dificuldades financeiras reestruturar suas dívidas e operações.

“Em 2025, nosso foco será maximizar a produtividade e reduzir custos. A busca por eficiência é essencial para aumentar nossa competitividade e excelência operacional”. Ferrer concluiu o vídeo comprometendo-se a manter os colaboradores informados pessoalmente conforme as negociações avançarem.

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