Transporte Moderno – Quais são as principais medidas que já estão sendo adotadas pelo Ministério dos Transportes para a redução de emissões de poluentes no setor de transportes?
Cloves Eduardo Benevides – É importante considerar o Brasil no contexto do Plano Clima e a participação do Ministério dos Transportes nesse processo. O compromisso brasileiro apresentado tem metas bem arrojadas e é um marco. O plano está dividido em dois grupos principais: o primeiro, focado em agricultura, desmatamento e uso da terra, e o segundo, englobando as demais áreas de governo, incluindo o Ministério dos Transportes.
Transporte Moderno – E como o Ministério dos Transportes participa desse debate?
Cloves Eduardo Benevides – O Ministério participa ativamente, coordenando dois grupos dentro do Plano Clima: o grupo de adaptação e o grupo de mitigação. É a partir desses grupos que surgem as metas e compromissos do setor.
Transporte Moderno – Quais ações concretas o Ministério tem implementado nesse sentido?
Cloves Eduardo Benevides – Temos adotado algumas medidas estruturais. A primeira delas é a perspectiva de novas tecnologias. A emissão de poluentes está diretamente relacionada ao uso da infraestrutura e ao tipo de energia utilizada. Dentro disso, temos algumas medidas em andamento. Uma delas é a implementação do da pesagem dinâmica. Essa tecnologia visa reduzir a necessidade de frenagens e acelerações, o que, consequentemente, diminui a emissão de poluentes.
Transporte Moderno – E quanto ao free flow, pedágio automático?
Cloves Eduardo Benevides – O free flow é outra frente importante. Esse sistema de pedágio automático, que substitui as cancelas tradicionais, também contribui para a redução de emissões, já que elimina a necessidade de paradas e acelerações nos pedágios. Estamos na fase de definição de parâmetros e cronograma para a implementação e mensuração dos resultados.
Transporte Moderno – Quais são os potenciais de redução de emissões dessas tecnologias?
Cloves Eduardo Benevides – O free flow, por exemplo, tem um grande potencial, pois elimina diversas paradas dos caminhões, aumentando a eficiência e reduzindo a emissão de poluentes. Estamos ainda na fase de testes e mensuração dos resultados, mas os dados preliminares indicam que há um grande potencial de redução.
O Ministério dos Transportes tem desenvolvido também uma diretriz para a criação de corredores de transporte com foco na transição energética. Todos os novos contratos de concessão, a serem assinados no próximo ano, terão uma cláusula que dedica 1% do valor à transição energética e à adaptação da infraestrutura. Isso inclui a instalação de postos de recarga e o uso de biocombustíveis, além de outras tecnologias para medir a pegada de carbono nos corredores de transporte.
Transporte Moderno – O número de veículos com tecnologias mais limpas ainda é pequeno em relação à frota total de caminhões que tem idade média avançada e, portanto, polui mais. Como o Ministério dos Transportes enxerga esse desafio?
Cloves Eduardo Benevides – De fato, a frota de veículos mais limpos é pequena, mas já é um avanço importante para viabilizar novas tecnologias que ajudam a reduzir a emissão. Um dos gargalos que enfrentamos é a questão da intermodalidade. O Brasil é altamente dependente do transporte rodoviário, que hoje representa 65% do transporte de carga. Estamos desenvolvendo estratégias para incentivar outros modais, especialmente o ferroviário, que pode ser uma grande solução ambiental.
Transporte Moderno – Detalhe sobre o plano de expansão do transporte ferroviário de cargas.
Cloves Eduardo Benevides – O governo está finalizando um plano para induzir novos projetos e, em breve, será lançado um plano de concessões para o setor ferroviário. Isso inclui uma série de medidas para acelerar o processo de licenciamento e aumentar a malha ferroviária no Brasil, com foco em ligar mais regiões aos portos.
Transporte Moderno – Qual o impacto do desenvolvimento do setor ferroviário para a redução de emissões?
Cloves Eduardo Benevides – A estimativa é que, com a expansão do modal ferroviário, um aumento de apenas 1% na utilização desse modal pode resultar em uma redução de até 8% nas emissões. Isso é significativo, especialmente quando consideramos que o modal ferroviário é muito mais eficiente em termos de redução de emissão de poluentes do que o rodoviário.
Transporte Moderno – Além do ferroviário, outros modais poderiam ajudar nessa redução de emissões?
Cloves Eduardo Benevides – Sim, embora o ferroviário tenha um grande potencial, também temos as hidrovias e a cabotagem, que são muito limpas. O Brasil tem muitos rios navegáveis, e, agora, está em andamento um plano de concessão de hidrovias que pode reduzir o uso do transporte rodoviário. A cabotagem, embora ainda pequena, tem grande potencial de contribuir para a redução de emissões, e estamos incentivando o seu uso.
Transporte Moderno – Existe algum levantamento que mostra qual a redução de emissões que a cabotagem pode proporcionar?
Cloves Eduardo Benevides – A cabotagem, por ser mais eficiente e menos poluente que o transporte rodoviário, tem um potencial significativo de redução de emissões, especialmente quando consideramos o uso em rotas curtas e médias.
Transporte Moderno – A ideia é, ao integrar todos esses modais e tecnologias, que o Brasil consiga cumprir seus compromissos de redução de emissões?
Cloves Eduardo Benevides – Exatamente. A ideia é integrar todas essas frentes: reduzir a dependência do rodoviário, expandir a infraestrutura ferroviária, dar nova utilidade a trechos ferroviários desativados, adotar novas tecnologias e, claro, trabalhar com outros modais como as hidrovias e a cabotagem. Com isso, o Brasil tem um compromisso muito claro, que é reduzir 67% das emissões até 2035, em comparação com os níveis de 2005.
Transporte Moderno – O que podemos esperar do Ministério dos Transportes para a descarbonização, considerando as iniciativas mencionadas anteriormente, como biocombustíveis e pedágio free flow?
Cloves Eduardo Benevides – Estamos falando de diversas iniciativas, como infraestrutura para novos biocombustíveis, aumento da utilização de outros modais e melhorias no transporte ferroviário. São estratégias para reduzir emissões, aumentar a eficiência e facilitar o transporte de forma mais sustentável.
Transporte Moderno – Com a pressão global de redução de emissões pode, finalmente, a ajudar a equilibrar o uso dos modais no Brasil?
Cloves Eduardo Benevides – Depende muito de como o mundo avançar nas estratégias de financiamento climático. A transição para um modelo mais sustentável tem custos, e alguém precisa arcar com isso. O debate sobre o financiamento da agenda climática global, que inclui um valor de R$ 300 bilhões, é essencial para viabilizar essa mudança.
Transporte Moderno – A renovação da frota de caminhões é uma solução viável para reduzir as emissões no Brasil. Mas ainda não há um programa de renovação permanente…
Cloves Eduardo Benevides –Toda transição tem um custo, e esse é um debate que o vice-presidente Geraldo Alckmin está conduzindo com muito cuidado e base técnica. A questão é: qual o impacto global da renovação da frota? Embora a descarbonização seja incontestável, é preciso considerar como essa transição afeta a economia local e global.
Transporte Moderno – Então, o impacto econômico precisa estar no centro da discussão. Mas, como o Brasil poderia financiar um programa de renovação de frota permanente?
Cloves Eduardo Benevides – A falta de financiamento é, de fato, um obstáculo. E é aí que entra o mercado global de carbono, que é um compromisso de todos os países. Se uma região não conseguir atingir suas metas, ela poderia direcionar recursos para áreas que precisam de apoio para substituir mais rapidamente suas frotas. Estamos falando de uma missão global: o planeta precisa reduzir a temperatura, e os compromissos de cada país precisam se alinhar. Isso torna o processo complexo, mas é possível.
Além da renovação da frota, outros fatores, como a regulação de motores, também podem contribuir para a redução de emissões. A Confederação Nacional do Transporte (CNT), por exemplo, tem defendido que, além da renovação da frota, a regulação de motores e processos de testagem também podem ser ferramentas importantes para garantir a redução de emissões. E isso poderia se tornar uma ação pública, ajudando na transição para uma frota mais limpa.
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