Transporte Moderno – A empresa nasceu em 2019 e enfrentou logo de cara a pandemia. Como foi esse desafio?
Kassio Seefeld – A pandemia foi um grande desafio, porque tínhamos apenas um ano de operação quando todas as restrições de deslocamento foram impostas. Os caminhões, inicialmente, pararam, e nosso negócio, que depende do abastecimento, sofreu bastante. Mas logo o transporte foi considerado essencial e as operações retomaram com força. Crescemos muito, pois éramos uma das únicas empresas — talvez a única — que foi para a rua, ao lado do transportador, entendendo que, se eles estavam na rua, tínhamos que dar o suporte necessário. Esse foi um divisor de águas para nós, pois as empresas e motoristas passaram a contar conosco para resolver problemas de abastecimento, e pudemos mostrar o nosso serviço. Este mês, devemos movimentar aproximadamente 25 milhões de litros de combustível, só em abastecimento externo — um volume expressivo.
Transporte Moderno – A empresa processa uma infinidade de dados todos os dias. Como transformar esses dados em informações e gerar valor para as transportadoras?
Kassio Seefeld – Estamos começando a criar data lakes com os bancos de dados que temos. São mais de 110 mil transações de abastecimento aprovadas por mês em postos de combustível, mais de um milhão por ano, além de outras operações, como dados de pedágio, motoristas, entre outros. Obviamente, estamos atentos às restrições e limites impostos pela LGPD, assim como à incorporação de ferramentas de Inteligência Artificial para incrementar a análise desses dados e gerar valor para o cliente — por exemplo, ajudando a criar rotas mais eficientes e operações mais dinâmicas, considerando as jornadas de trabalho do caminhão e do motorista, resultando em ganhos efetivos. Hoje, os transportadores, muitas vezes, não sabem onde seus caminhões estão abastecendo, pernoitando ou se o local é o melhor ponto em termos de segurança e preço de combustível.
Temos uma empresa de rastreamento, mas as administrações são separadas. Planejamos integrar essas informações e entregar algo concreto para o transportador. Uma transportadora com 100 caminhões, por exemplo, gerencia no mínimo 100 motoristas, além de folgas, abastecimentos, pedágios e outros gastos.
Transporte Moderno – Como foi o ano de 2024 em termos de geração de negócios?
Kassio Seefeld – Tínhamos grandes expectativas com o agronegócio, mas os desafios climáticos impactaram negativamente o setor. Mesmo assim, crescemos 59% no primeiro semestre, em termos de faturamento de transações. Em março, lançamos um produto para a gestão de manutenções de veículos, em parceria com uma montadora de caminhões, e pretendemos expandi-lo para todo o mercado. Esse produto foca na manutenção preventiva, corretiva e recorrente. Contamos com oficinas credenciadas, onde o motorista sabe quanto pode gastar, com aprovação prévia da transportadora. Viabilizamos tudo para o motorista, que está cadastrado em nossa plataforma. Foi um sucesso, e já estamos transacionando mais de R$ 5 milhões com esse produto, atendendo quase mil caminhões em manutenção.
Transporte Moderno – E para o futuro?
Kassio Seefeld – Em 2025, pretendemos entrar na área de seguros. Isso faz total sentido para nós, pois é um dos maiores custos do transportador. Muitas empresas não contratam seguros por desconhecer os custos adequados. Esse é um prolongamento natural da nossa atuação, visando aprimorar a gestão de risco. Nosso objetivo é trabalhar ao lado das seguradoras para criar mais eficiência e reduzir custos para o transportador.
Queremos criar um ecossistema completo para transportadoras e motoristas. Nosso atendimento é o único do setor 100% humanizado, 24 horas por dia, sete dias por semana. É uma das nossas receitas de sucesso. Para nós, é essencial que o motorista, ao parar no posto, possa nos contatar por WhatsApp ou ligação e ser atendido por uma pessoa desde o primeiro momento. Esse diferencial tem dado resultados, pois os motoristas apreciam o atendimento que recebem.
Transporte Moderno – A empresa tem planos de atuar em modelos de distribuição urbana?
Kassio Seefeld – Temos projetos no papel e muito interesse em participar, mas é um negócio completamente diferente. Atendemos algumas frotas leves, mas o perfil é distinto, inclusive na experiência do usuário. No last mile, nos centros urbanos, a agilidade é essencial. Já o abastecimento de caminhões é mais demorado e envolve outras necessidades. Hoje, nosso foco é 95% rodoviário.
Transporte Moderno – Há possibilidade de serem comprados por um grupo maior?
Kassio Seefeld – A empresa foi fundada com a perspectiva de não ser vendida. Somos uma startup com três sócios e, desde o início, a ideia foi não vender participação sem um propósito maior. No futuro, um sócio investidor pode ser bem-vindo para expandir e até internacionalizar a empresa. Hoje, não há nada concreto. Recebemos propostas no passado, mas recusamos, pois o objetivo sempre foi criar uma empresa sólida e perene. Muitos de nossos clientes transportam cargas para países como Argentina, Chile e Paraguai, mas essas operações exigirão estudos mais detalhados.
Transporte Moderno – Como avalia os desafios para a adoção do novo sistema de pedágio, o free flow?
Kassio Seefeld – Segundo a Associação Brasileira das Empresas de Pagamento Automático para Mobilidade (Abepam), o número de motoristas que aderiram às tags automáticas cresceu cerca de 50% entre março de 2020 e julho de 2023, totalizando mais de 12 milhões de usuários. Entretanto, o free flow, um sistema de pedágio sem cancela, ainda enfrenta desafios de compreensão e aceitação no país, especialmente entre as frotas pesadas, que representam a maior parte do transporte de cargas no Brasil.
A falta de familiaridade do público com essa tecnologia é um fator crucial. Muitos motoristas não compreendem completamente como funciona o pedágio sem cancela, o que gera dúvidas sobre a cobrança correta e os procedimentos em caso de problemas. Nas frotas pesadas, essa falta de conhecimento causa resistência, pois as transportadoras têm receio de adotar uma tecnologia nova e pouco testada no país.
A implementação do free flow exige um investimento inicial em infraestrutura, incluindo sistemas de leitura de placas, câmeras, sensores e tecnologias de comunicação para identificar corretamente os veículos nos pontos de cobrança. À medida que mais testes forem realizados e o sistema se adaptar à realidade brasileira, essa tecnologia poderá se expandir para as frotas pesadas e, eventualmente, integrar o sistema rodoviário nacional. No entanto, no Brasil, os processos legislativos são frequentemente burocráticos e demorados, o que dificulta a adoção de novas tecnologias.