Os grandes produtores de veículos comerciais e seus principais fornecedores lidam, nas últimas décadas, com os mais complexos problemas de toda a sua história. E tudo isso de uma só vez: enfrentam os enormes custos dos investimentos no desenvolvimento de tecnologias que permitam a efetiva redução das emissões de poluentes, enquanto operadores e a sociedade cobram maior segurança nas operações. Além disso, há a busca por um gerenciamento eletrônico que oriente e corrija eventuais falhas dos motoristas, ou até que proporcione completa autonomia na condução das enormes composições rodoviária.
Todos estes desafios não cessam, pois a cada passo dado, para cada projeto finalizado já existe uma ou várias novas solicitações. A implantação do Euro 6 ainda não está finalizada e a Euro 7 só entrará em vigência apenas na virada da década, com adiamento provocados pelas pressões dos produtores de automóveis e vans.
E historicamente estes investimentos já ultrapassaram a casa dos bilhões de dólares. E os burocratas de Bruxelas, de onde saem as diretrizes da União Europeia, continuam a inventar novas restrições.
“Precisamos de uma sequência mais lógica na entrada das novas alternativas de emissões”, comenta Renato Faria, executivo da Bosch, a maior fabricante de componentes e sistemas para a indústria automobilística e a maior produtora de tecnologia para o setor.
“A introdução crescente do biodiesel já existe, mas precisa ser aperfeiçoada, ainda tem restrições de utilização, mas deverá crescer nos próximos anos. O HVO, sem nenhum tipo de problema operacional, precisa de ajustes na questão da produção e preço. O gás é uma alternativa perfeitamente viável, mas falta uma rede de abastecimento nas principais rotas. Também ainda existem questionamentos quanto ao gás natural ou o biogás”, comenta Faria.
O executivo salienta que a indústria investiu pesado nos últimos anos e conseguiu algumas alternativas factíveis, com custos operacionais interessantes, mas que ainda existem os desafios para viabilizar algumas das alternativas mais interessantes.
Um dos exemplos mais gritantes é o hidrogênio, com a Mercedes-Benz a apresentar na IAA Transportation 2024 o seu modelo já bem testado e com autonomia comprovada de 1047 quilômetros, mas que faltam postos de reabastecimento. E aí Hildegard Müller, presidente da VDA, a Anfavea alemã, cobrou pesado dos governos europeus a implantação da infraestrutura, tanto para o reabastecimento quanto para os elétricos. “A indústria fez sua parte para atender às recomendações da União Europeia. Agora faltam os investimentos para recarga.”
A cobrança é justa. Afinal, no mesmo estande da Mercedes-Benz estava o caminhão e-Actros, com um consumo equivalente de 10 litros para cada 100 quilômetros. E outros gigantes da indústria de veículos comerciais também apresentaram seus modelos e mostraram estar com produtos para atender as necessidades do Net Zero.
Em todos estes projetos a Bosch é a principal parceira. “A nossa preocupação é que a mesma necessidade de infraestrutura é fundamental para a viabilização destes produtos de alta tecnologia. O tema descarbonização está na ordem do dia, mas o TCO – ou seja o custo operacional – é que vai decidir o futuro destes produtos. “A Bosch tem tecnologias para todas as aplicações, mas vai depender da necessidade do mercado e a existência de infraestrutura para operação destes produtos”, explica Faria.
Ressalta, inclusive, a questão do Euro 7. “No Brasil implantamos no ano passado o Euro 6. E na Europa adiaram a entrada do Euro 7 para a virada da década. Mesmo atenuado para os automóveis e vans, manteve as normas previstas para os veículos comerciais. Já trabalhamos a injeção de alta pressão, já fizemos o pós-tratamento, já otimizamos o possível. Daqui em diante é fundamental reflexão antes de imaginar ainda mais mudanças”.
Mas se aconteceu um adiamento para 2030 os burocratas da União Europeia introduziram algumas emissões não regulamentadas, como o oxido nitroso (N20). Mais ainda: a Euro 7 introduz limites mais rígidos para as emissões de partículas produzidas durante a frenagem, com limites específicos para veículos elétricos. Ou seja, emissões de pneus e freios entram nas novas normas.
O adiamento do prazo em 5 anos, pela União Europeia, foi uma vitória dos fabricantes de automóveis e vans, que demonstraram que seria inviável cumprir os prazos e que os investimentos necessários atrasariam a chegada dos elétricos. “A evolução das tecnologias fica cada vez mais custosa e com benefício marginal e uma das boas alternativas é buscar mais soluções com combustíveis alternativos e renováveis,” finaliza Faria.
Fred Carvalho é jornalista profissional há mais de 50 anos e é palestrantre em vários eventos do setor automotivo, qlém de ser um estudioso de economia e negócios da indústria e apaixonado em transformar informações em conhecimento. Lecionou sobre a história da indústria automobilística e, atualmente, é diretor editorial na OTM Editora.