Empresas de transporte apostam em gestão mais eficiente para descarbonizar a frota

Transportadoras contam que miram mais na saúde financeira e na otimização da operação, cruciais para reduzir emissões, do que na aquisição de veículos a gás ou elétricos

Nem caminhões a gás e nem caminhões elétricos, algumas transportadoras e operadoras logísticas estão ‘apostando as fichas’ em uma gestão operacional e financeira mais eficiente para cumprirem suas metas de descarbonização

Aline Feltrin

Nem caminhões a gás e nem elétricos, algumas transportadoras e operadoras logísticas estão ‘apostando as fichas’ em uma gestão operacional e financeira mais eficiente para cumprirem suas metas de descarbonização. Esse é o caso TKE Logística, de Araranguá (SC), transportadora especializada em carga lotação. Embora a redução de emissões de poluentes continue sendo um objetivo importante, a empresa enfrenta desafios significativos em termos de infraestrutura e tecnologia.

Atualmente, a TKE está testando caminhões a gás em rotas específicas, entre Rio de Janeiro e São Paulo, onde a infraestrutura de abastecimento é mais robusta. No entanto, a falta de postos de abastecimento em outras regiões, como entre o Paraná e São Paulo, limita a expansão dessa iniciativa.

“Estamos comprometidos com a sustentabilidade, mas precisamos ser realistas sobre as limitações que enfrentamos. O gás é uma opção viável em algumas rotas, mas a falta de infraestrutura é um obstáculo real em outras áreas”, destacou o gerente administrativo da empresa, Franco Gonçalves.

Franco Gonçalves, gerente administrativo da TKE Logística (Divulgação)

Saúde financeira

O executivo conta que está acompanhando de perto o desenvolvimento de novas tecnologias, como o biodiesel de segunda geração (HVO) e o hidrogênio, mas reconhece que essas soluções ainda estão em fase de desenvolvimento e dependem de avanços tecnológicos e regulamentares para se tornarem viáveis em larga escala.

Em meio aos esforços de descarbonização, a TKE enfatiza a importância de manter uma saúde financeira sólida antes de priorizar projetos de sustentabilidade. A empresa destaca que a viabilidade econômica é crucial para garantir que as operações possam continuar e, eventualmente, incorporar tecnologias mais limpas.

“Nosso foco é estarmos financeiramente saudáveis. Só assim poderemos investir em iniciativas de sustentabilidade sem comprometer nossa operação”, enfatizou Gonçalves.

Revisão das expectativas

Com uma frota própria de 140 conjuntos de caminhões e implementos rodoviários, a TKE está empenhada em reduzir a idade média de seus veículos para melhorar a eficiência operacional e reduzir as emissões de carbono. Conforme Gonçalves, essa estratégia inclui uma renovação constante da frota, mas com um enfoque cuidadoso no atual cenário econômico e nos custos elevados dos novos veículos.

Segundo o executivo, o atual cenário, inclusive, levou a empresa a rever para baixo sua expectativa de crescimento para esse ano, o que a fez colocar o pé no freio em novos investimentos em frota. Segundo Gonçalves, inicialmente, a TKE planejava um aumento de 15% no faturamento para este ano, mas agora espera manter o patamar do ano passado devido aos impactos adversos que têm atingido o setor de transporte, o que inclui a recente tragédia ambiental que acometeu o Rio Grande do Sul. O estado representa 35% do volume operado pela TKE.

A empresa também havia planejado uma renovação significativa da sua frota, com a aquisição de 20 novos veículos. No entanto, diante das dificuldades, decidiu reduzir essa meta para 14 veículos, um reflexo direto da necessidade de contenção de gastos e reavaliação de prioridades.

“Estamos em um período em que a cautela é fundamental. As incertezas econômicas nos forçam a rever nossos planos de expansão para garantir a sustentabilidade do nosso negócio”, explicou o executivo da TKE.

Gestão mais otimizada

Embora a expectativa da Transjordano, transportadora e operadora logística de Paulínia (SP) seja mais positiva, com um crescimento esperado de 35% neste ano, a head de estratégia e gestão da companhia, Joyce Bessa, compartilhou com o portal Transporte Moderno que a principal aposta da empresa para descarbonizar também está focada na melhoria contínua da gestão. Ela revelou que todos os anos o faturamento da Transjordano cresce em dois dígitos principalmente por causa dessa estratégia.

Conforme a executiva, o aprimoramento de alguns índices como mais km por litro de diesel, que resulta em economia de combustível, melhor aproveitamento dos veículos e otimização da operação ajudam a melhorar os resultados financeiros e, consequentemente, a reduzir as emissões de carbono. “Algumas das nossas premissas é agregar valor às operações dos nossos clientes propondo soluções mais eficientes, entre e as quais rodar mais com menos caminhões”, diz. Assim, é possível otimizar o contrato de serviços e todos saem ganhando, afirma Joyce.

Ela revela que a empresa já realizou testes com caminhões a gás, mas que esses veículos não se encaixam na realidade da empresa. “Nós temos uma grande capilaridade em todo o Brasil e necessidade de abastecer em diversos locais, por isso a infraestrutura atual não nos atende.”

Por fim, a executiva comenta que há muito foco nos veículos elétricos e a gás para descarbonizar a frota de caminhões no Brasil, no entanto existem soluções que as empresas podem adotar no dia a dia para emitir menos poluentes que podem ser muito mais eficientes.

As condutas de gestão adotadas pelas duas transportadoras corroboram com a visão de especialistas em gestão de frotas. Em evento recente sobre o tema organizado Sindicato das Empresas de Transportes e Cargas de Campinas e Região (Sindicamp), Rafael Fanchini, CEO da Verda, especializada em auxiliar empresas do setor a se organizarem rumo à redução de emissões de poluentes disse que o futuro bem-sucedido da descarbonização do transporte depende de um planejamento cuidadoso por parte dos operadores logísticos e transportadores.

A importância da preparação

O executivo da Verda afirmou também que a jornada rumo à descarbonização é longa, e, quanto mais cedo as empresas começarem, melhor preparadas estarão para enfrentá-la. “Além disso, há um diferencial competitivo crucial em jogo: os clientes já estão solicitando, ou em breve solicitarão, medidas sustentáveis”, disse.

Conforme Fanchini, se os transportadores puderem oferecer soluções antes mesmo de serem demandadas, estará à frente do jogo. “Ignorar essas demandas pode resultar em problemas significativos para o seu negócio”, disse.

A diretora de responsabilidade social e ambiental da Kairos Carbon, Alanna Wilcek, também reforçou a importância de as empresas conhecerem profundamente as operações, identificar os pontos de estrangulamento e compreender o contexto operacional. “A descarbonização vai além de simplesmente adotar práticas sustentáveis. E fundamental garantir que as operações permaneçam eficientes e rentáveis.”

Allana enfatizou ainda que, além das iniciativas sociais, é essencial manter a saúde financeira da empresa. “Para isso, o planejamento estratégico deve incluir análises detalhadas e estudos aprofundados.” Conforme a executiva, essa abordagem integrada assegura que a transição para uma operação mais sustentável seja bem-sucedida, garantindo não apenas benefícios ambientais, mas também econômicos e sociais.

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Ramon Alcaraz, CEO da JSL: “O mercado de logística é altamente fragmentado, oferecendo amplas oportunidades de consolidação e expansão. Desde que abrimos capital, triplicamos de tamanho ao saltarmos de uma receita anual de R$ 3,5 bilhões para R$ 10 bilhões”

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