Sonia Moraes
A Mercedes-Benz espera desempenho melhor do mercado de caminhões no segundo semestre devido às perspectivas positivas em relação a movimentação de grãos que podem impulsionar as vendas veículos. “Este ano está totalmente atípico, com dificuldades para medir o tamanho de compras antecipadas de modelos Euro 5 efetuadas no fim do ano passado, mas estamos tentando entender o que vai acontecer no segundo semestre em relação às compras ligadas ao agronegócio”, disse Roberto Leoncini, vice-presidente de vendas e marketing caminhões e ônibus da Mercedes-Benz do Brasil, em entrevista exclusiva para a Transporte Moderno.
Na avaliação de Leoncini, o estoque de modelos Euro 5 que ainda existe na rede de concessionários e nas locadoras pode atrapalhar o desempenho do mercado em 2023. “De janeiro a maio, tivemos uma queda interessante, com o nível de emplacamento de caminhões Euro 6 muito baixo, o que mostra que o setor está voando abaixo da altitude de cruzeiro e não há certeza quando irá chegar no céu de brigadeiro sem o resquício de modelos Euro 5, que ainda têm, e entender qual o tamanho do mercado de modelos Euro 6.”
Se for considerado o nível de emplacamento diário em junho, será preciso haver uma recuperação bem significativa para o mercado de caminhões chegar nos mesmos números de 2022, segundo Leoncini. “Eu acho bem difícil. A dificuldade não é somente o Euro 6, este é o menor dos problemas porque não tem nada disruptivo que causa apreensão. Temos outros fatores que são as taxas de juros elevadas e a dificuldade de acesso ao crédito, o que desestimula o empresário de fazer investimentos. A hora que ele olha o custo do financiamento prefere esperar porque o negócio não remunera para pagar este tipo de financiamento”, comentou.
Sobre a expectativa de a taxa de juros cair, Leoncini comentou que é preciso olhar o arcabouço fiscal do governo que está sendo votado. “Temos uma inflação num nível de 4% a 5% ao mês e Selic de 13,75%, em juros reais estamos falando de 8%, o que é muito alto para investimento em caminhões e bens de produção.”
A expectativa de Leoncini é de que haja uma sensibilidade por parte do Banco Central de enxergar essa tendência, porque a taxa de juros de longo prazo no último mês já caiu com os sinais de que o arcabouço fiscal vai ser votado e aprovado. “A dúvida é qual a velocidade será a queda da Selic e se isso vai mudar a intenção dos bancos de liberar crédito para o setor de transporte de cargas e de passageiros.”
Leoncini destacou que a venda de um caminhão novo depende do mercado de usados, que é também depende das condições do financiamento, e o custo hoje para o financiar um caminhão novo, dependendo do spread cobrado, chega a 20% ao ano. “A conta não fecha e o mercado desacelera, fica mais difícil vender o usado e o cliente prefere esperar o momento mais propício para investir.”
Incentivo tributário-
Com relação ao incentivo tributário de R$ 700 milhões concedido pelo governo federal para o setor de caminhões, Leoncini considerou ser um passo em uma grande maratona. “É interessante o governo conceder alguma facilidade para o segmento, enxergando a sua importância e amarrando com a renovação de frota, mas é preciso entender os mecanismos para isso acontecer.”
E Leoncini exemplificou: “Quando se leva em conta que R$ 700 milhões para o segmento de transporte de carga, o maior benefício estaria no caminhão extrapesado, com desconto de R$ 80 mil na compra de um modelo novo, estamos falando de nove mil caminhões, é cerca de um mês de emplacamento. “Então, não vai ser algo que será um divisor de água, mas é um caminho que está sendo apontado que pode ser um modelo para o futuro.”
Leoncini ponderou que para um caminhão de 20 anos, um semipesado que vale R$ 180 mil, o incentivo para tirar este veículo do mercado é por volta de R$ 40 mil a R$ 60 mil. “Para caminhões mais velho, de 30 anos, pode ser interessante. Tem que ter uma largada de incentivos, mas é preciso de uma taxa de juros adequada, porque o dono de um caminhão de 30 anos pode usar o valor do incentivo para a entrada em um caminhão de 15 anos e financia o restante. Aí a roda vai girando.”
Sobre outros setores que estão demandando caminhões, Leoncini destacou o de mineração, para o qual já vendeu cerca de 440 Arocs desde o lançamento, e que ainda tem demanda com os novos projetos de mineração que estão em fase de implantação fora do país.
“Outro segmento, dentro do agro, que este ano e no ano que vem vai ser muito bom é o de cana-de-açúcar. Devido às secas e inundações que ocorreram em países produtores de açúcar, a oferta caiu muito e o preço vai ser interessante. Então, há potencial neste setor, no de mineração, madeira e na de infraestrutura, porque em algum momento irão começar as concessões novas e isso vai demandar movimentação de material, de terra e precisar de caminhões.”
Emplacamento –
Sobre as vendas de caminhões, Leoncini comentou que a média mensal de sete mil a oito mil veículos emplacados é muita baixa ao se comparar com as dez mil unidades vendidas no passado. “Essa média caiu devido ao delay entre o que já foi faturado para os clientes e ainda não aparece no emplacamento porque os veículos estão no implementador, como é o caso de um chassi para caminhão semipesado. Para o modelo extrapesado, o prazo é curto porque não se faz muita modificação no cavalo mecânico.”
Leoncini observou que no início do ano o mercado estava contaminado pela antecipação de compra, e agora com o estoque de modelos Euro 5 e o início da venda de modelos Euro 6. “Então, ao dizer que o mercado caiu 30, 20 ou 10% e atribuir isso somente ao Euro 6 estaríamos cometendo um erro muito grande. Acho que vamos conseguir ter esse comparativo por volta do terceiro e quatro trimestre porque não teremos nada de Euro 5.”
Na visão de Leoncini, a expectativa da Anfavea sobre o mercado de caminhões é realista, mas ele acredita que o setor poderá ter surpresa positiva ou negativa. “Tudo depende da Selic e do custo de financiamento porque há tendência de o PIB no Brasil melhorar, principalmente o setorial, que impacta positivamente no mercado de caminhões”, disse o executivo.
Outro momento positivo apontado pelo executivo se refere ao escoamento de soja que, com a chegada da safra de milho, deverá causar um rush na logística e vai precisar de muita capacidade de transporte em curto prazo. “Para o setor de transporte é positivo porque o preço do frete melhora e tem que ter disponibilidade.”
O vice-presidente de vendas da Mercedes-Benz recorda que o setor automotivo já passou por anos desafiadores, em 2018 e 2019 que foram difíceis com o mercado retraído. “Hoje, mesmo com todos esses pontos de interrogações o mercado aponta para ser maior que em anos de crises. Temos problemas pontuais, taxa de juros e o custo do financiamento por causa da retração dos bancos na concessão de crédito, que prejudica bastante o setor. Mas temos que prestar a atenção com o que vai acontecer com o plano safra em 2024 porque na colheita deste ano são 145 milhões de toneladas e vamos ter rush na logística.”