O mito do elétrico

Sergio Habib, presidente do Grupo SHC e da JAC Motors, acredita que muitos aspectos relacionados ao processo de eletrificação estão mais ligados ao marketing que à realidade financeira e operacional

Fred Carvalho

O Grupo SHC apresentou o seu décimo veículo elétrico, o furgão e-JV5.5, com área de carga de 5,5 metros cúbicos e mais de 800 kg de carga útil. “É perfeito para transporte urbano, no anda e para do trânsito, mas recomendável para quem percorre mais de 180 km por dia”, salienta Sergio Habib, presidente do grupo SHC e da JAC Motors.

Podem existir exceções, como aquelas empresas que percorrem quilometragem menor, mas têm compromissos com os seus clientes de zero emissões para atender aos requisitos ESG. “Nestes casos não importa o custo, pois é uma questão de imagem, de compromissos com seus acionistas”, destaca Habib.

O JV5-5 tem autonomia de 300 km, bateria de 50 kWh, e a carga rápida é feita em uma hora e demora 6h40 min. em carga lenta. “É muito econômico, seu custo por km rodado é de R$ 0,10 enquanto um furgão igual a diesel tem custo de R$ 0,76. Ou seja, é imbatível”, diz Habib.

Mais ainda: a revisão não ultrapassa duas horas, portanto a disponibilidade de veículo é muito maior que os movidos a diesel. O preço anunciado do novo furgão é de R$ 314,9 mil. A estimativa de vendas é de 50 unidades mensais.

O MITO DO ELÉTRICO

Apesar de ter feito forte aposta nos elétricos, tanto autos quanto veículos comerciais, Habib acredita que toda movimentação em cima dos elétricos tem muito de marketing e pouco de realidade financeira e operacional. “Comerciais leves para uso urbano, ou mesmo curtas distancias entre Sorocaba, Santos, Suzano, São José dos Campos, viabilizam economicamente o totalmente elétrico. Em termos econômicos são imbatíveis.”

Mas quando se fala em caminhões médios ou pesados para distâncias médias ou longas, tipo Rio de Janeiro ou Porto Alegre, torna-se inviável pelo enorme peso das baterias – que tiraria espaço da carga – bem como pelo enorme tempo de recarga. “Não adianta teimar, veículos comerciais de média e longa distância só serão viáveis quando tivermos o fuel cell, mas ainda falta muito para chegar lá.”

INVIÁVEIS –

A sua crítica mais forte, no entanto, é dirigida aos automóveis elétricos. “O valor de venda é entre duas a três vezes maior que o similar com motor térmico. Mesmo para padrões europeus é caro, e somente os muito endinheirados têm condições de comprar um, mesmo com a enorme coleção de incentivos. Aqueles países com renda per capta de US$ 45 mil, caso da Alemanha, França e Reino Unido, as vendas já alcançam 20%. Já na Itália, com renda de US$ 31 mil, as vendas caem para 4%, e na Polônia cai para 15 mil e a participação para 1%. No Brasil, com renda de US$ 9 mil o percentual cai para 0,4%. Mas os incentivos daqueles mais ricos estão sendo retirados.”

“Nos Estados Unidos, com renda per capita de U$ 66 mil a penetração dos elétricos é de 4,7%, mas com fortes diferenças entre os estados. Enquanto a Califórnia dá incentivos de U$ 6 mil e tem uma política energética cheia de restrições, os BEV (Veículos Elétricos a Bateria) atingem 12%. Mas no petrolífero Texas o índice cai para 0,1%. Os prognósticos apontavam uma redução no preço dos elétricos, e o que aconteceu é que teve um bom aumento. E o preço das baterias, ao contrário dos prognósticos, não caiu, mas sim subiu”.

“Na China, as dificuldades para a compra de um veículo com motor térmico são muito grandes. Em algumas grandes cidades, existe um leilão para comprar as placas. E os que conseguem têm de pagar o equivalente a U$ 15 mil. Além de várias restrições quanto à circulação. Afinal a China tem sérios problemas de poluição em algumas grandes megalópoles e também busca incrementar ao máximo a venda dos elétricos, não só na China, mas em todo o mundo. Eles dominam a tecnologia, produzem as baterias e veículos”

A obrigatoriedade dos legisladores europeus e de boa parte do mundo em proibir os motores convencionais é, no entender de Habib, algo incompreensível. “Tudo estava preparado para o diesel, mas veio o dieselgate, o escândalo que surgiu nos Estados Unidos. Acabaram com o diesel e todos os projetos com um combustível com excelente rendimento térmico”.

Todos os estudos passaram a indicar que a solução era o híbrido, que faria a ponte até a chegada de um elétrico bem resolvido em termos de autonomia, reaproveitamento das baterias, carregamento mais rápido. No entanto, a grande surpresa foram os legisladores, os políticos, a determinar o fim dos motores a combustão.

PROTESTO –

Raras foram as vozes de protesto. Destaque para Carlos Tavares, CEO da Stellantis, que deixou claro que os burocratas governamentais estavam errados. Da inviabilidade de adoção do elétrico em tão curto espaço de tempo, tanto na questão da escala de produção das baterias, as novas fábricas para produção dos elétricos, do tempo necessário para criar as redes de carregamento.

O ex-CEO do grupo Volkswagen, Herbert Diess, também avisou ser impossível instalar todas as quatro mega fábricas de baterias necessárias para atender a produção de veículos no curto prazo. Depois de outros embates com os burocratas e com alguns fortes acionistas, foi despedido.

As próprias estatísticas de vendas de elétricos são criticadas por Habib. “Não é correto adicionar as vendas dos híbridos – que têm um motor térmico – com volumes enormes pois mais acessíveis e sem os problemas de recarga, aos BEV. O correto é informar exatamente o que cada tecnologia vende.”

Marcia Pinna O novo furgão da JAC tem autonomia de 300 km (Divulgação)

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