Sonia Moraes
Depois de acompanhar o desempenho mundial durante a pandemia, quando a maioria das economias apresentou queda brusca e retomada rápida, o Brasil inicia 2022 com muitas incertezas. “Não temos as mesmas expectativas que o mundo, os países desenvolvidos e outros emergentes têm. Há muitas incertezas em relação ao futuro das contas públicas do país. A economia se recuperou, mas está perdendo fôlego, e vamos entrar 2022 com tendência de queda”, afirmou Antonio Lanzana, economista e professor da FEA (USP) em sua palestra sobre a economia brasileira e as expectativas para 2022, durante o seminário anual do Sindicato Interestadual da Indústria de Materiais e Equipamentos Ferroviários e Rodoviários (Simefre).
Na avaliação do economista, em 2022 o Brasil terá uma economia impactada pelo cenário político e as variáveis financeira – taxa de câmbio, bolsa e risco país – terão muita volatilidade. “A inflação vai dominar o cenário econômico, mas vai ceder, com alguns economistas prevendo que fique abaixo de 5%. O que acho muito difícil cair de dez para cinco em um único ano porque a taxa de câmbio continuará elevada. Então, a meta que o governo busca vai ficar para 2023.”
Lanzana comentou que com os aumentos salariais previstos para o ano que vem cria-se uma resistência para uma queda mais forte da inflação. “Há ainda a previsão da Enel de aumento de 20% na energia, o que é uma variável de peso importante na inflação, de reajuste no transporte público no início do ano, na educação que variou negativamente em 2021 e no preço do serviço.”
A taxa de juros, que hoje está em 9,5%, vai continuar alta, podendo chegar a 11,5% no ano que vem, e o câmbio estará muito contaminado pelo cenário político, segundo o economista. “Mas alguns fatores vão expandir a atividade da economia. O auxílio Brasil é um deles porque vai dar mais renda para as pessoas gastar, embora não seja maior que o auxílio emergencial em termos de cobertura, que atingiu 63 milhões de pessoas – o auxílio Brasil prevê atingir 17 milhões –, mas é um impacto positivo na economia”, destacou o professor.
As exportações e o agronegócio vão continuar bem, mantendo a competitividade do Brasil. “Temos possibilidade de melhora no mercado de semicondutores no segundo semestre com solução definitiva em 2023”, projetou Lanzana. “Por outro lado, temos alguns fatores que puxarão a atividade econômica para baixo, como é o caso da inflação, que derruba a capacidade de compra das pessoas. E, se olhar o salário real médio no terceiro trimestre está 11% abaixo do ano anterior.”
O economista comentou que o mercado de trabalho está fraco, as famílias estão endividadas e há incertezas com relação a sucessão presidencial. “O índice de confiança do consumidor brasileiro está caindo e impactando negativamente na economia. Da mesma forma está em queda o índice de confiança empresarial e da área industrial. Diante desse quadro podemos esperar um baixo crescimento em 2022. A economia deve crescer 0,5% sobre uma base mais alta registrada em 2021. Tivemos uma atividade que fez um V e agora voltou ao normal.”
Para Lanzana, a taxa de câmbio permanecerá elevada por causa das incertezas das contas fiscais. “Isso joga a taxa de câmbio para cima e a consequência é o risco Brasil em alta.”
Recessão –
Em 2021 o Brasil está tecnicamente em recessão em dois semestres seguidos, segundo Lanzana. “Comparando janeiro a outubro do ano passado com o mesmo período de 2020 o crescimento é de quase 5%, mas se comparar com o mesmo período de 2019 o aumento é muito fraco, de 0,4%, mas vamos fechar o ano com crescimento razoável.”
Na avaliação de Lanzana, o que ajudou o PIB brasileiro em 2021 foram as exportações. “O agronegócio, apesar da queda por causa clima no terceiro trimestre, vai bem, o que explica a alta demanda por implementos rodoviários. A construção imobiliária que estava indo bem perdeu o fôlego no terceiro trimestre por causa da alta na taxa de juros. Isso explica também porque o Brasil manteve bom desempenho na produção de bens de capital, puxado pelo agronegócio e a construção civil.”
O professor ressaltou que há um comportamento bastante diferenciado na economia brasileira. “O problema maior é a inflação e faz tempo que não tínhamos inflação de dois dígitos acima de 10%, o que é quase o dobro do teto da meta deste ano, que é de 5,25%.”
O que está por traz dessa inflação, segundo Lanzana, é a taxa de câmbio, acima do que é estruturalmente correto. A restrição de oferta na área industrial, principalmente de semicondutores, também pressiona muito a inflação e o custo de energia. “O petróleo subiu muito, o que fez a gasolina avançar quase 50% neste ano, e ainda tem o custo de energia elétrica, que é um fator que pesa em função da situação hídrica”, explicou.
Em 2021, as exportações continuaram favoráveis, mas a economia apresenta estagnação no último trimestre do ano, com o PIB crescendo 4,6% sobre 2020 e 0,3% sobre 2019. “Muita gente achou que a flexibilização das regras sanitárias iria gerar um grande impulso no crescimento do PIB e não ocorreu porque as pessoas passaram a comprar mais serviços, a ir mais a restaurantes e compraram menos bens. Até as vendas dos supermercados estão caindo”, disse Lanzana.
Porque essa liberalização não impactou a economia? “Porque a inflação corroeu a capacidade de compra das pessoas. E o que temos, além disso, é o maior nível de endividamento das famílias no passado recente e o encolhimento do custo do crédito, que acompanha a evolução da Selic.”
No cenário econômico mundial, a expectativa é favorável para 2022, com crescimento acima da média, o que continuará favorecendo a atividade exportadora. “Devemos ter um crescimento forte dos Estados Unidos, um crescimento da China, embora perdendo um pouco de fôlego, e expectativa de crescimento da Europa. Todo esse cenário vai trazer impacto positivo sobre a economia brasileira”, observou Lanzana.