Transporte Moderno – O senhor acredita que o compartilhamento de boas práticas de ESG (environmental, social and governance) em eventos como o II Fórum Transporte Sustentável podem inspirar outras empresas a inovar no que se refere à sustentabilidade?
Fernando Simões Filho – Acredito que o compartilhamento é fundamental e vital para os temas de sustentabilidade avançarem. Minha crença é que nesses temas não deveria haver competitividade, pois estamos olhando para objetivos comuns e melhorias que queremos alcançar como sociedade, muita além de conquistas empresariais.
Além disso, muitas dessas conquistas só serão realizadas se forem feitas em conjunto e precisamos dessa troca e do setor andando junto. Parcerias na cadeia com fornecedores e clientes têm sido cada vez mais frequentes, mas acredito que teríamos um avanço enorme e um impacto positivo ainda maior para a sociedade se as parcerias e trocas também ocorressem entre concorrentes.
Transporte Moderno – Como a sustentabilidade foi incorporada ao grupo Simpar? As questões ligadas a ESG são prioritárias para a empresa?
Fernando Simões Filho – Os princípios de sustentabilidade (ESG) estão no centro da estratégia de todas as empresas da Simpar há bastante tempo e integram o nosso modelo de gestão, que contempla a geração de valor sustentável em todos os nossos negócios.
Muitas das ações de sustentabilidade já ocorrem na empresa há muito tempo, mas esse tema se tornou ainda mais estratégico em 2018, a partir da criação do Comitê de Sustentabilidade da Simpar. Sendo que atualmente são cinco comitês de sustentabilidade: da Simpar, da Movida, da JSL, da CS Brasil e do Grupo Vamos. Além disso, somos signatários do Pacto Global, desde 2014, com o objetivo de reforçar o compromisso com os desafios propostos pela ONU com a Agenda 2030.
Transporte Moderno – Quais as principais ações do grupo nessa área?
Fernando Simões Filho – Monitoramos continuamente uma série de indicadores socioambientais nos comitês de sustentabilidade, de forma a desenvolver e planejar as melhores práticas dentro dos pilares de ambiental, social e governança. Então, são diversos projetos, como de redução de resíduos, melhor uso de recursos naturais, diversidade, mas para citar melhor alguns mais relevantes temos:
Na esfera ambiental, temos um programa de gestão de emissões, com foco em identificar os maiores desafios e oportunidades para o setor logístico. Atualmente, trabalhamos com o apoio de consultoria externa no aprimoramento da estratégia de descarbonização e temos uma meta já formalizada com o mercado de, em dez anos (até 2030), reduzir em 15% nossa intensidade de emissões.
Também já temos feito o plantio de árvores para a neutralização de parte das nossas emissões, como por exemplo a Movida, que já contratou o plantio de um milhão de árvores para um projeto de resgate da biodiversidade na margem do rio Araguaia.
No tema social, criamos um programa de inclusão seguindo nossa estratégia de contribuir com o desenvolvimento social em regiões em que as empresas do Grupo Simpar atuam. Intitulado Você quer? Você pode! – formar para transformar, o programa busca formar jovens que vivem em casas de acolhimento e em situação de vulnerabilidade, ampliando assim as suas oportunidades para geração de renda e perspectivas de futuro. Realizado em parceria com o Instituto Ser+, o programa trabalha o autoconhecimento, a autoestima e a descoberta do talento, além de explorar a capacidade dos jovens para atividades profissionais. Cerca de 25 jovens do Alto Tietê (São Paulo), primeira região onde implantamos o projeto piloto desse programa, 96% dos jovens finalizaram o curso e foram contratados pelas empresas da Simpar como jovens aprendizes. Os jovens contratados serão acompanhados ao longo do processo de aprendizagem por programa de mentoria e equipe especializada.
Outro projeto também é o Mulheres na direção, que forma motoristas mulheres para serem motoristas de caminhão. Para garantir o sucesso do programa, cuidamos previamente da preparação dos times, líderes e executivos, por meio de treinamentos sobre vieses inconscientes e envolvimento das motoristas mulheres que já atuam na JSL. É uma iniciativa inédita para o setor, na qual oferecemos mais oportunidades às mulheres no segmento de transporte.
Na questão de governança, vale ressaltar a certificação da Movida como Empresa B e temos usado a ferramenta de avaliação do Sistema B como um guia para a evolução de todos os negócios e em breve esperamos ter mais empresas no grupo conquistando essa certificação. Além disso, outro ponto fundamental no tema de governança de uma holding de capital aberto são as transações entre partes relacionadas e nisso temos nos empenhado e tido um enorme cuidado e respeito a todos acionistas minoritários, tanto da holding como de cada uma das empresas. Um bom exemplo disso, é a operação mais recente entre CS Brasil e Movida.
Transporte Moderno – Quais as dificuldades em adotar práticas ESG no setor de transporte e logística?
Fernando Simões Filho – Os desafios são muitos, mas isso também se traduz em muitas oportunidades. O setor é muito masculino e com isso também se tem alguns pré-conceitos e vieses inconscientes sobre o tema de diversidade, mas com o objetivo de trazer mais mulheres para esse setor começamos a monitorar e medir indicadores de mulheres e homens como motoristas e temos visto uma performance excelente das mulheres, performance acima da média em melhor consumo de combustível e menos acidentes.
Também foi sempre um desafio estabelecer parcerias com clientes para gestão e redução de emissões, pois a logística é o Escopo 3 dos nossos clientes. Este escopo sempre teve pouca pressão por redução. Mas, temos avançado em boas parcerias, como nosso apoio, através da JSL, ao projeto Águas da Mantiqueira juntamente com a Fundação Toyota do Brasil, no qual nos comprometemos com a restauração um hectare de floresta no município de Sapucaí Mirim (MG), na Serra da Mantiqueira. Conseguimos neutralizar 5% das emissões de GEE das operações entre JSL e Toyota por meio deste projeto e a restauração ecológica contribuirá para o desenvolvimento de cerca de 2,5 mil plantas nativas e permitirá a absorção de até 200 toneladas CO₂, além de auxiliar na recuperação de bacias hidrográficas e na conservação da fauna.
Além dessa ação com a Toyota, temos também o projeto Vamos Carbono Zero, da nossa controlada Vamos. Ele é realizado em parceria com a Ciclus Ambiental, que captura o gás metano através do tratamento de lixo em aterros sanitários e o processa para a produção de combustível biogás – todo esse processo gera créditos de carbono. Nossa frota da Vamos já faz parte do programa – e inclusive nossas emissões de 2019 e 2020 já foram 100% neutralizadas – mas indicamos aos nossos clientes a adesão no momento da locação, assim a quantidade de carbono emitida pelo veículo é compensada em créditos de carbono. A compra desse crédito viabiliza outros negócios sustentáveis, evitando o envio de gases poluentes, como o metano, para a atmosfera.
Por sinal, o Escopo 3 é um tema muito importante para trabalharmos nesse setor. Como não somos uma indústria e temos frota própria, terceiros, agregados e outros modelos em outras empresas, os escopos 1 e 3 muitas vezes se confundem e conceitualmente são muito similares. Nosso setor precisa fortemente fazer a gestão do Escopo 3, pois grande parte dessas emissões são de carreteiros agregados e microempresários que não farão a gestão de emissões se não dermos suporte.
Transporte Moderno – O senhor acredita que o setor de transporte e logística tem avançado nesse aspecto?
Fernando Simões Filho – Acredito que sim. Acredito que o setor tem sido visto como um ator fundamental para termos uma economia de baixo carbono e, em especial, a diminuição ou fim do consumo de combustível fóssil tem uma consequência significativa em produtos derivados como plástico e outros, então esse setor precisa avançar nessa pauta e já tem melhorado o olhar de que, como setor, não somos um problema para emissões de carbono e gases e que podemos sim ser parte da solução.
Transporte Moderno – Quais as maiores tendências de ESG para o setor?
Fernando Simões Filho – Para mim, a emergência climática já não é mais tendência, mas sim uma realidade e quem não estiver fazendo nada já está muito atrasado. A mesma pressão que temos tido por ações no aspecto ambiental, acredito que será uma tendência no social, tratando os temas de diversidade e indo além da diversidade de raça e gênero, mas também de classes sociais, de egressos do sistema prisional, de jovens em alta vulnerabilidade e que não tem acesso a mercado de trabalho. A causa social é urgente, em especial em um país como o nosso, de enorme desigualdade.
E acredito que o ASG (ESG) veio para ficar. Com isso acredito que teremos uma consolidação de métricas (uma espécie de rating) para nortear melhor as avaliações, melhorar a gestão das empresas no tema e, principalmente, irmos amadurecendo o assunto no mercado como um todo e excluindo o que é greenwashing e destacando as empresas que estão fazendo apenas marketing, mas com pouco avanço real nos temas de ASG.
Mais informações: II Fórum Transporte Sustentável